TAISA ZANINI
33 anos, mãe de um lindo menino de 6 anos,
diagnosticado com autismo.
O meu filho sempre foi diferente. Mesmo quando bebê. Não ficava nos lugares conosco, não
ficava no colo quieto, nem no bebê conforto, nem na mesa, corria sem parar, gritava, não
sentava, não demostrava
prazer pela comida, não sorria para nós, não fitava o olhar, não me reconhecia e parecia surdo.
Comecei
a ficar preocupada. Será que era coisa da minha cabeça? Só eu via que ele não estava
agindo como os outros? Levei em alguns
médicos e me pediram para ter paciência, alegavam que cada criança se
desenvolve de uma maneira. Não consegui. Nunca tive muita paciência. Sou imediatista, inconstante, impaciente. Já
havia ouvido falar de médicos que dão pouca ou nenhuma importância para o que
as mães observam em seus filhos.
Naquela
época eu agi por instinto, hoje eu agiria com conhecimento. Até que notamos, eu e meus pais, que ele fazia coisas
extraordinárias. Sabia todas as bandeiras de todos os países do mundo, acessava
qualquer site na internet com os dedinhos mais ágeis possíveis, normalmente em
inglês ou espanhol, cantava um milhão de músicas com letras compridas inteirinhas,
tinha um vocabulário impresionantemente
culto...
Mas
não dizia mamãe, água, vovó .
Meu filho não se comunicava comigo. Não sabia coisa alguma e suas
necessidade dele e sentimentos sobre ele, se tinha fome, sede...e me sentia distante. Era como
se houvesse uma barreira de vidro entre nós dois e eu não conseguia me
aproximar. Isso sim me causava pesar. Sonhei em ser mãe como aquelas que a
gente vê nas ruas, onde as crianças ficam grudadas nas mães, não passam a noite
fora, choram por colo... Isso
não acontecia.
Um dia, prestes a completar 2 anos notamos que ele não estava
decorando tudo isso. Ele estava lendo. Sim!!! Ele lia tudo! Devorava livros na
livraria em minutos, rótulos,
bulas de remédio, letras de músicas, notícias em revistas, navegava como um adulto
treinando o que queria aprender . Se deixássemos ele passaria o dia inteiro, sem
comer, dormir, ir ao banheiro e principalmente sem falar conosco, apenas no
computador. Ele queria ler, todos os tutoriais possíveis de jogos para aprender
como executar o jogo.
Me lembro claramente de um dia em particular,
onde eu ouvi a palavra autismo alto pela primeira vez. Meu pai tinha vindo para
natal e estava com ele sentado no colo, no s olhamos e ele falou: "_Filha,
você sabe né?! O
nosso bebê pode ser autista." Me lembro que eu
parei e pensei que precisava ler sobre isso para responder com certeza. Mas
respondi: "_Ok, eu sei pai." Não senti nada. Não doeu nada. Eu
não estava em choque. Eu apenas sabia.
Começamos a corrida por todos os profissionais possíveis. E
decidimos começar todas as terapias inerentes à um tratamento para autista
independente do diagnóstico, afinal, eu já sabia. E antes tratar e não
precisar, do que ter perdido um tempo precioso. Sábia
decisão a minha.
Começamos aos 2 anos acompanhamento com fonoaudiólogos,
psicopedagogos, terapeutas ocupacionais, equoterapia (me lembro que meu irmão,
padrinho do Jorginho, trouxe uma égua aqui para natal para ele), psicólogos e
fizemos, eu, meu irmão e meus pais TODOS os cursos que haviam na época sobre
autismo para aprendermos tudo o que podíamos. Modificamos nossa rotina, mudei
minhas prioridades e minha casa.
Muita gente me procura para
conversar, principalmente no período de descoberta do diagnóstico. Tenho um
orgulho enorme em dizer que ajudei algumas pessoas, por incrível
que pareça NUNCA me ocorreu o sentimento de
tristeza. Um medinho assim do novo pode ser. Ele nasceu diferente, sim! É daí?!
Também não sou igual a ninguém. Para mim e para minha família o
autismo não veio pesado. Chegou leve, como uma brisa. Uniu. Provocou mais amor
e mais tolerância. Como eu poderia me entristecer?!
Estou longe de ser a mulher mais
equilibrada do mundo, não é isso! Mas não sei explicar porque essa notícia
não causou transtornos. Me tornei mais
forte, equilibrada, mais tranquila, mais paciente, mais humilde...O autismo
abriu as porta de um mundo muito mais humano. Eu me transformei e vi a
transformação de muita gente.
Tenho lembranças muito claras de
momentos importantes. No dia que eu recebi o diagnóstico pela primeira vez, meu
pai e minha mãe foram com ele no meu consultório e me deram o melhor apoio do
mundo. Minha mãe chorou. Não a culpo. Alguém precisava chorar.
E meu pai disse: "_Filha, fique tranquila. Nós estamos aqui para ajudar você. Não ficará sozinha. Se eu tiver que vender a roupa do
corpo eu vendo, mas ele terá todo o tratamento que for preciso." Depois
disso meus pais vieram morar em Natal. Obrigada família. Nunca me senti
sozinha. pai, você, meu irmão e minha mãe foram minhas pernas. Felizmente não foi
preciso vender nada. Graças a Deus.
Hoje, o meu bebê já está um rapaz independe e muito maduro. Quando
eu digo maduro, falo que ele tem maturidade emocional para
compreender as suas próprias limitações. Ele sabe exatamente o que pode
desencadear um estresse para ele. E deixa
isso sempre muito claro pra nós. Quer um exemplo bem claro da maturidade
desse menininho tão jovem? Ele sempre diz. "Não me apresse, minha cabeça
fica confusa e não consigo realizar as tarefas." OK!!!! A gente entende e
respeita. Hoje temos uma vida
social ativa e relaxada (festinhas, mas não muitas e nem com músicas muito
altas e muito menos com muitos meninos jogando futebol, afinal as regras do
futebol são confusas), ele hoje tem
uma comunicação espetacular, uma inteligência que me deixa babando e um humor
incrível! Esse ano reduzimos todas as terapias e
como a socialização dele está muito bem, investimos no que ele gosta de verdade.
Leitura e línguas (ah, e os eletrônicos! Ele pira nesses games on line,
conversa com muitas crianças em outras línguas). Quer saber mais?
Agora ele me pede o colo. Se vai dormir na casa da vovó, no dia seguinte me
liga avisando que vai voltar em breve, que sente saudades. Eu amo ter isso! É
bem verdade que nem tudo são flores perfumadas.
Ainda
existe o diagnóstico e com isso algumas
outras tantas dificuldades
relacionadas ao autismo que lidamos diariamente. Seguir regras é uma tortura para ele. Estabelece
organização nas tarefas múltiplas
é um desastre. Os barulhos, mudança de
rotina e situações de estresse são capazes de desencadear crises rápidas. Essas coisas
precisam ser trabalhadas diariamente. E a alimentação ainda tira o sono da
mamãe aqui. Mas isso a gente tira de letra.
Quando me pedem para falar da história dele eu fico logo
animada! Porque foi de longe um caminho fácil. Foi difícil de verdade!
Muita gente hoje chega para mim e diz assim:
Taisa, tem certeza que essa criança é autista? ; Taisa, seu filho se superou mesmo?
Ele já não era "leve"? Eu no começo me incomodava com isso, hoje eu conto a
história dele. Me disseram para não esperar muito dele. O meu
filho só foi falar comigo quase aos quatro anos. Meu
filho é um caso de criança autista diagnosticada precocemente e com tratamento
precoce. Tendo bons resultados. Fiz
tudo por ele e para ele sem nunca deixar de ser eu. Deixei de sair, cuidei do
meu filho sozinha, fui mãe e pai, (o
que parecia uma responsabilidade pesada demais pra uma mulher só, e de fato
foi. Eu era sozinha nessa caminhada. Voltei a sair, decidi que o mundo teria que se adaptar a ele, e não ele ao
mundo, briguei com meio mundo pelos direitos dele, quase enlouqueci com a
escola, na recepção do parquinho, no estacionamento, botei o meu dedo na cara
de muita gente que chamou meu filho de mal
educado quando tinha crises, até que venci pelo cansaço. Eu venci. Eu
perdi o medo. E no final das contas eu tenho um orgulho imenso dele. Porque ele
é lindo, inteligente, perspicaz, E
sobre mim?
Eu tenho muita sorte!